17 de dezembro de 2010
Operadores verofuncionais em termos de condicionais e negação*
Nós não precisamos do operador para determinar os valores de verdade de P e de Q. No entanto, para uma fórmula com a conjunção ser verdadeira, P e Q terão de ser verdadeiras.
Para ilustrar isso, observe a tabela de verdade da conjunção:
P Q P ^ Q
V V V
V F F
F V F
F F F
Alguns operadores não são verofuncionais. Operadores não-verofuncional construirão proposições cujos valores de verdade não podem ser determinados somente com base no valor de verdade da proposição ou proposições concatenadas ao operador. Ao dizermos que João acredita que Q, em que Q é “Maria é estelionatária”, não podemos concluir nada sobre o valor de verdade de Q. Em outras palavras, não sabemos se podemos ou não enquadrar Maria no artigo 171 do Código Penal brasileiro.
Meu objetivo aqui, no entanto, não é exatamente discorrer sobre os cinco operadores verofuncionais em separado, e sim tentar demonstrar que podemos reduzi-los a apenas dois, nomeadamente, negação e condicional. A minha fonte principal na empreitada é o capitulo sobre lógica proposicional do livro “Logic for Philosophy”, do filósofo Ted Sider, atualmente professor na Universidade de Nova York. O procedimento será o seguinte: primeiro, vou transcrever a conjunção em termos de condicional, depois será a vez de a disjunção ter o mesmo tratamento e, por último, e da mesma forma, a bicondicional. No que concerne à conjunção, a demonstração é do próprio Sider. A disjunção e a bicondicional são tentativas minhas e eu não sei se estão corretas. Provavelmente estão erradas e por esse motivo agradeço ao leitor quaisquer correções.
Antes de tudo, a definição de interpretação pode ser útil:
Interpretação: uma interpretação é uma função (i) que assume para A o valor de 1 ou de 0. Se, por exemplo, uma proposição atômica P tiver o valor 1 ela é verdadeira, ao passo que se tiver o valor 0 é falsa. Assim, podemos dizer, por exemplo, que i(P) = 1 ou que i(P) = 0. Como em uma função um ou mais inputs só podem ser ligados a um output, concluímos que a função de verdade seja de uma proposição atômica P ou de uma fórmula mais complexa como P → Q tem de ser considerada em termos de verdade ou falsidade, e nunca ambas as coisas ao mesmo tempo.
Ligado ao que foi dito acima, Sider nos oferece um símbolo (V) correspondente a função do valor de verdade para expressões complexas. Por exemplo, podemos escrever a fórmula complexa acima nos seguintes termos: Vi (P → Q) = 1.
Como queremos tratar de condicionais e negações, definamos seus valores de verdade:
Condicional: o valor de verdade da condicional é verdadeiro se, e somente se, o seu antecedente for falso ou o seu conseqüente for verdadeiro. Dessa forma, temos que Vi (A → B) = 1 se, e somente se Vi (A) = 0 ou Vi (B) = 1.
Negação: o valor de verdade de uma proposição negada é verdadeiro se, e somente se, a negação da negação dessa dada proposição que acabamos de mencionar for falsa. Temos, então que Vi (~A) = 1 se, e somente se, Vi (A) = 0.
Vejamos as tabelas de verdade, respectivamente, da condicional e da negação:
P Q P → Q
V V V
V F F
F V V
F F V
P ~P
V F
F V
Já vimos alguma coisa sobre a conjunção, então definamos seu valor de verdade como verdadeiro se, e somente se, Vi (A) = 1 e Vi (B) = 1.
Disjunção: o valor de verdade de uma disjunção é verdadeiro se, e somente se, um de seus disjuntos for verdadeiro. Assim, Vi (A V B) = 1 se, e somente se, ou Vi (A) = 1 ou Vi (B) = 1.
Bicondicional: o valor de verdade de uma bicondicional é verdadeiro se, e somente se, o valor de verdade de A for igual ao de B. Assim, Vi (A ↔ B) = 1 se, e somente se, Vi (A) = Vi (B).
Quando falamos de valor de verdade dos operadores não estamos nos referindo ao valor de verdade de um “e” isolado, por exemplo. Referimo-nos, sim, a quaisquer fórmulas bem formadas que contenham os operadores, como, por exemplo, P ^ Q.
Veja as tabelas de verdade, respectivamente, da disjunção e da bicondicional:
P Q P V Q
V V V
V F V
F V V
F F F
P Q P ↔ Q
V V V
V F F
F V F
F F V
Passemos, então, para a demonstração do valor de verdade da conjunção em termos de condicional:
Conjunção
Assumamos que Vi (A ^ B) = 1 para chegarmos no seguinte resultado: Vi (A) = 1 e Vi (B) = 1. Ou seja, para podermos dizer que se o primeiro, então o segundo.
Vi (A ^ B) = 1 é equivalente a Vi (~(A → ~B)) = 1.
Se Vi (~(A → ~B)) = 1, então a negação disso, que é Vi (A → ~B) = 0 (ver regra da negação).
Com a definição da condicional em mente, sabemos que não é o caso de ou Vi (A) = 0 ou Vi (~B) = 1. Se não é o caso disso, temos, então, por De Morgan, que Vi (A) = 1 e Vi (~B) = 0. Aplicando a regra da negação em Vi (~B) = 0, podemos concluir que Vi (B) = 1. Assim, Vi (A) = 1 e Vi (B) = 1.
O que acabamos de ver foi o seguinte: Vi (A ^ B) = 1 → Vi (A) = 1 e Vi (B) = 1.
Façamos agora o caminho de volta para tentar demonstrar que se Vi (A) = 1 e Vi (B) = 1, então Vi (A ^ B) = 1.
Assumamos que Vi (A) = 1 e Vi (B) = 1. Assim, uma vez que Vi (B) = 1, sabemos pela regra da negação que Vi (~B) = 0. Dada a definição da condicional, sabemos que não é o caso de Vi (A → ~B) = 1. Portanto, pela negação novamente, Vi (A → ~B) = 0. E mais uma vez pela negação, Vi (~(A →~B)) = 1. Uma vez que Vi (~(A → B)) = 1, então Vi (A ^ B) = 1.
Portanto, Vi (A ^ B) = 1 se, e somente se, Vi (A) = 1 e Vi (B) = 1. □
Disjunção
Queremos demonstrar que Vi (A V B) = 1 se, e somente se, ou Vi (A) = 1 ou Vi (B) = 1.
Vi (A V B) = 1 é equivalente a Vi (~A → B) = 1. Assumindo que Vi (~A → B) = 1, então Vi ~(~A → B) = 0. Pela Negação da Condicional, temos que Vi (~A ^ ~B) = 0.
Mas pensemos em Vi ~(~A → B) = 0. Façamos, aqui, com esta condicional, o mesmo que foi feito acima, na demonstração da conjunção.
Sabemos que não é o caso – pela definição da condicional - de Vi (A) = 1 ou Vi (B) = 0. Por De Morgan, sabemos que Vi (~A) = 1 e Vi (~B) = 0. Pela negação, sabemos que Vi (A) = 0 e Vi (B) = 1. A definição da condicional nos diz que ou Vi (A) = 0 ou Vi (B) = 1.
Uma vez que Vi (A V B) = 1, essa mesma fórmula posta de forma condicional tem de ter valor igual a 1.
Assim, Vi (~A → B) satisfaz a definição (note os valores de A e B no penúltimo parágrafo). Portanto, Vi (~A → B) = 1.
Vimos que Vi (A V B) = 1 se, e somente se, Vi (A) = 1 ou Vi (B) = 1.
Façamos agora o caminho de volta para tentar demonstrar que Vi (A) = 1 ou Vi (B) = 1 se, e somente se, Vi (A V B) = 1.
Assumamos que Vi (A) = 1 ou Vi (B) = 0. Podemos dizer, assim, que Vi (~A) = 0 ou Vi (~B) = 1. Porém, se formos aplicar a regra da condicional, veremos que não é o caso de Vi (~A) = 0 ou Vi (~B) = 1. Logo, temos, novamente por De Morgan, que Vi (A) = 0 e Vi (B) = 1. Isso satisfaz a definição da condicional de que ou Vi (A) = 0 ou Vi (B) = 1. Colocando, então, em forma de condicional, podemos dizer que Vi (~A) = 1 → Vi (B) = 1. Assim, Vi (~A → B) = 1 e, conseqüentemente, Vi (A V B) = 1.
Assumamos, agora, que Vi (A) = 0 ou V(i) B = 1. Aqui o trabalho parece ser mais fácil, uma vez que o que temos aqui é a própria definição da condicional. Assim, podemos dizer que Vi (~A → B) = 1. Por conseguinte, Vi (A V B) = 1.
Vimos, com isso tudo, que Vi (A V B) = 1 se, e somente se, ou Vi (A) = 1 ou Vi (B) = 1. □
Bicondicional
Vejamos o que acontece com a bicondicional. Vamos relembrar o que foi dito sobre ela: o valor de verdade de uma bicondicional é verdadeiro se, e somente se, o valor de verdade de A for igual ao de B. Assim, Vi (A ↔ B) = 1 se, e somente se, Vi (A) = Vi (B).
Assumamos que Vi (A ↔ B) = 1. Isso significa que Vi (A) = 0 e Vi (B) = 0 ou Vi (A) = 1 e Vi (B) = 1.
Assim, podemos dizer que Vi ~ (A ↔ B) = 0. Disso, podemos extrair que Vi ~ (A ↔ B) = 0 é equivalente a Vi (A) = 1 e Vi (B) = 0 ou Vi (A) = 0 e Vi (B) = 1.
Aplicando a regra da condicional, vejamos como funcionam os diferentes valores de verdade para A e para B. O que podemos notar, e não acredito que seja por acaso, é que a condicional funciona de acordo com a regra nas ocasiões em que os valores de verdade de A e B são iguais. Vejamos:
Vi ((A) = 0) → (Vi (B) = 0) = 1
Vi ((B) = 0) → (Vi (A) = 0) = 1
Vi ((A) = 1) → (Vi (B) = 1) = 1
Vi ((B) = 1) → (Vi (A) = 1) = 1
Compare com o que ocorre quando tentamos valores diferentes para A e B:
Vi ((A) = 0) → (Vi (B) = 1) = 1
Vi ((B) = 1) → (Vi (A) = 0) = 0
Vi ((A) = 1) → (Vi (B) = 0) = 0
Vi ((B) = 0) → (Vi (A) = 1) = 1
Assim, se Vi (A) = Vi (B), a bicondicional tem valor 1. E se a bicondicional tem valor 1, Vi (A) = Vi (B). Veja que tanto a “ida” quanto a “volta” das condicionais assumem valor 1 se os valores de A e B forem os mesmos. Isso, no entanto, não ocorre quando assumimos valores diferentes para A e B.
Assim, podemos dizer que Vi (A ↔ B) = 1 se, e somente se, Vi (A) = Vi (B). □
Referências:
Sider, Theodore (2010). Logic for Philosophy. Oxford: Oxford University Press
Downes, Stephen, “Operadores Proposicionais”, em Crítica na Rede. http://criticanarede.com/operator.htm (acessado em 30/04/10)
Newton-Smith, W. H. (1985) Lógica: Um Curso Introdutório. Trad. D. Murcho. Lisboa: Gradiva, 1998.
9 de agosto de 2010
Financiamento público de cultura: os mecenas não estão na festa
Como o povo não sabe de nada, os acadêmicos e, claro, os políticos acabam decidindo pelo púbico o que é, afinal, de interesse público. Em alguns casos, isso custa dinheiro. Tomemos o exemplo do financiamento da cultura com recursos de governos. A pergunta é: por que um padeiro que jamais se interessou por literatura tem de ajudar a financiar a vinda de escritores estrangeiros ao Brasil? Mais: por que um administrador de empresas que jamais se interessou por cinema tem de bancar a realização de um filme que ele jamais vai ver? A maioria dos artistas, escritores e cineastas produzem coisas que o grosso da população não se interessa e que provavelmente jamais vai se interessar. Infelizmente, temos de encarar a realidade. Quase todo mundo vai continuar escutando Ivete Sangalo e não notará a menor diferença no universo caso todos os escritores importantes desapareçam das livrarias.
Tivemos recentemente, no Rio de Janeiro, a Festa Literária Internacional de Paraty, conhecida como Flip. Muita badalação e escritores consagrados, como o britânico Salman Rushdie, mundialmente conhecido após o líder islâmico Aiatolá Khomeini ter colocado sua cabeça a prêmio por causa de passagens do livro Versos Satânicos. Como toda festa, a Flip custou bastante dinheiro. E parte do dinheiro veio do bolso do contribuinte, uma vez que o estado não produz riqueza. A Folha de São Paulo informou que o Governo do Estado do Rio de Janeiro ficou com a responsabilidade de arcar com cifras milionárias relacionadas à realização do evento; isso sem falar nos recursos captados por meio da Lei Rouanet, que permite que empresas amaciem impostos com investimentos em cultura. Fez-se o evento e os convidados vieram de longe. O problema é que boa parte dos mecenas ficaram em casa assistindo televisão.
Existe uma obsessão de que a cultura – ou parte dela - deve ser financiada pelo governo. De uma hora para a outra, qualquer percursionista pode se sentir no direito de arrancar do bolso do contribuinte as divisas necessárias para gravar um disco que ninguém vai ouvir; da mesma forma, um cineasta pode agora pleitear recursos para fazer um filme que ninguém vai ver. Ingenuamente, eu achava que cultura era uma manifestação espontânea e que assim formaria sua própria demanda por um determinado produto ou estilo. Estava errado. Chegamos à divertida situação em que o erário precisa bancar manifestações culturais para forçar uma demanda que deveria ter surgido naturalmente.
Se a maioria das pessoas não liga para literatura, para cinema e para artes em geral, não há sentido forçá-las a pagar por isso. Tornar compulsório o financiamento de manifestações artísticas é desrespeitar o gosto pessoal do contribuinte; faz com que lhe seja retirado o direito de pagar somente pela arte que lhe aprouver. É infantilizá-lo. Se ninguém, por exemplo, quiser saber de teatro de rua, a única solução minimamente sensata é deixá-lo definhar. Não há motivos para forçar o consumo. Quem se interessar, que vá atrás. Muitas vezes, obscurecido por um discurso de interesse público, o que se vê é o puro interesse privado – seja do artista, da gravadora ou da editora. Na antiguidade e em períodos mais modernos, os grandes mecenas costumavam financiar os artistas por verdadeiro interesse na arte produzida. No Brasil, o mecenato é compulsório e a maioria dos ilustres mecenas não faz a menor idéia de quem financia.
20 de dezembro de 2009
De que lado está, senhor Altamiro Borges?
21 de novembro de 2009
Walter Sorrentino e eu
Walter Sorrentino acredita que os assassinatos que Cesare Battisti cometeu na Itália foram políticos. Eu não. Walter Sorrentino é um dos grandes nomes do PCdoB. Eu não. Walter Sorrentino justifica crimes de sangue quando enxerga motivações políticas em nome da “causa”. Eu não. Walter Sorrentino tem um blog chamado “Projetos para o Brasil”. Eu não. Walter Sorrentino deve se arrepiar todo quando pensa em colocar em prática seus projetos para o Brasil. Eu também me arrepio todo.
19 de novembro de 2009
Tarso Genro está de sacanagem
15 de novembro de 2009
O dito que nada diz
9 de novembro de 2009
Que não volte nunca mais
8 de novembro de 2009
Inversão*
A Universidade Bandeirantes (Uniban), depois de muita demora, resolveu agir. O caso é o seguinte: no dia 22 de outubro, a aluna de turismo Geisy Arruda foi à faculdade usando um vestido, assim, bem curtinho. Os outros alunos não gostaram. Por causa disso, fizeram uma baderna inacreditável por causa do paninho que a moça vestia. Geisy teve de ser retirada do local com a ajuda da polícia sob os gritos dos estudantes. Nada elogiosos, é claro. Todos estavam esperando a punição dos envolvidos para se colocar, enfim, uma pedra sobre o assunto. Mas o que a universidade fez? Expulsou Geisy. Para a Uniban, “a atitude provocativa da aluna resultou numa reação coletiva de defesa do ambiente escolar”. Ainda segundo a universidade, os alunos que foram identificados na algazarra foram suspensos temporariamente.
*Por motivos de pressão de todos os lados, a Uniban desistiu, nesta segunda (09), de expulsar Geisy.